07.08.2022
[Atos 17.10-15] 10Ao anoitecer, os irmãos enviaram Paulo e Silas a Bereia. Quando lá chegaram, foram à sinagoga judaica. 11Os judeus que moravam em Bereia tinham a mente mais aberta que os de Tessalônica e ouviram a mensagem de Paulo com grande interesse. Todos os dias, examinavam as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade. 12Como resultado, muitos judeus creram, assim como vários gregos de alta posição, tanto homens como mulheres. 13Mas, quando os judeus de Tessalônica souberam que Paulo estava pregando a palavra de Deus em Bereia, foram até lá e criaram um alvoroço. 14Os irmãos agiram de imediato e enviaram Paulo para o litoral, enquanto Silas e Timóteo permaneceram na cidade. 15Os que acompanharam Paulo o levaram até Atenas e, depois, voltaram a Bereia com instruções para Silas e Timóteo irem ao encontro dele o mais depressa possível.
Na medida em que o mundo caminha a passos largos para as grandes mudanças, digo: as decadentes reorganizações sociais, as depravadas reconfigurações morais, as desumanas redefinições sexuais – e aqui eu te poupo de ouvir a respeito de todos os esforços empenhados no Brasil e mundo afora, esforços esses pautados pelo marxismo cultural (i.e., feminismo, aborto, ideologia de gênero, reconfiguração do que estão chamando de família e casamento, teoria crítica de raça etc.)… te poupo de ouvir sobre essas pautas ideológicas – que são, realmente, de revirar o estômago do cristão bíblico, cristocêntrico… Enfim, na medida em que essas coisas se aceleram e o mundo vai se tornando caótico, uma qualidade que se busca cultivar nas pessoas é a de “mente aberta”.
Em face dessas transformações, você já deve ter ouvido (ou dito) – filhos são experts neste tipo de fala; formadores de opinião também: “Você não tem a mente aberta… Você precisa ter a mente aberta… Abraça a sua cabeça… Estamos em pleno século XXI…” E por aí vai. Realmente, há uma necessidade gritante de que as pessoas tenham a mente aberta; precisamos sim de que o ser humano abra a cabeça e aceite os fatos. Só que não da forma como estamos sendo desafiados (e até obrigados).
Olhe para o nosso texto com bastante atenção, Atos 17.11: “Os judeus que moravam em Bereia tinham a mente mais aberta que os de Tessalônica”. — Como assim?! — A tradução mais comum para a expressão “a mente mais aberta” (aplicada pela NVT) é a que foi utilizada pelas versões bíblicas ARA e NVI, nestes termos: “estes de Bereia [ou: os bereanos] eram mais nobres que os de Tessalônica [ou: do que os tessalonicenses]”.
Qual versão é a mais correta? ARA e NVI ou NVT?
Qual é a melhor tradução, “mente mais aberta” ou “mais nobres”?
De fato, os dois estão corretos. Só que, no meu entendimento, a NVT traduz melhor o significado para o leitor contemporâneo. David G. Peterson (no seu excelente comentário bíblico de Atos), informa que o termo utilizado aqui neste versículo – eugenesteroi, da raiz grega εὐγενής – se referia originalmente a alguém de nascimento nobre, de família nobre, mas veio a ser aplicado de forma mais geral ao tipo de comportamento nobre. Josefo, por exemplo, usou esta palavra para se referir a alguém de “alma nobre”.
O que significa, então, alguém de “alma nobre”?
Alma nobre diz respeito à gentileza, generosidade; refere-se a alguém que tem disposição para agir de modo diferente do esperado; faz referência a alguém de mente aberta para considerar, repensar, aceitar e agir diferentemente, gentilmente, generosamente. Lucas, portanto, ao empregar este termo aqui em Atos 17.11 quis destacar que os judeus bereanos não permitiram que qualquer preconceito os impedisse de dar a Paulo uma audiência justa. Contrário dos de Tessalônica, os judeus de Bereia agiram com nobreza, abriram a mente para ouvir o apóstolo Paulo que estava pregando na sinagoga.
É neste sentido, portanto, que eu insisto: você precisa ter a mente aberta; a mente aberta para ouvir a palavra de Deus, considerar a palavra de Deus e praticar a palavra de Deus. É disso que trata o texto de Atos dos Apóstolos em tela – nas palavra do pastor Paulo Anglada: o texto trata da genuína nobreza; em minhas palavras: o texto trata da mente verdadeiramente aberta.
Permita-me colocar de outra maneira: o texto que consideraremos nesta manhã exalta uma qualidade superior de nobreza, explica o que realmente significa ter a mente aberta, isto é, exorta-nos a cultivar a atitude virtuosa de se receber a palavra ou a pregação do evangelho de Cristo sem preconceito, avaliando-a honestamente à luz da palavra de Deus; porque, como veremos, longe de se tratar de uma investigação fria, meramente acadêmica, a conduta dos bereanos, ao receber, examinar e crer no anúncio do evangelho por parte de Paulo, oferece-nos um paradigma de como a pregação deve ser ouvida em qualquer época; isto é: com nobreza de alma, com a mente aberta.
A gente não pode se esquecer de que Paulo está em missão pela Europa – quer dizer, o apóstolo está percorrendo o solo do Ocidente, e ele está plantando a semente do evangelho por onde passa. Desse modo, após anunciar Cristo nas cidades de Filipos e Tessalônica, Paulo, Silas e Timóteo deram prosseguimento à obra missionária na Macedônia, pregando as boas novas de Cristo em Bereia.
Na primeira VIAGEM MISSIONÁRIA (At 13–15), Paulo e Barnabé haviam anunciado o evangelho lá no “velho” mundo: na ilha de Chipre e na Ásia Menor. Na SEGUNDA VIAGEM (At 16–19), auxiliado principalmente por Silas e Timóteo (uma vez que Lucas se estabeleceu em Filipos com a intenção de colocar em ordem a novel igreja, a primeira igreja na Europa), Paulo concentrou sua missão na Macedônia, onde estava situada a cidade de Bereia. A seguir, ele se dirigirá para a província romana da Acaia, ao sul, onde anunciará o evangelho nas importantes cidades gregas de Atenas e Corinto.
O APÓSTOLO PAULO CHEGOU A BEREIA, na providência de Deus, fugindo da perseguição que sofreu em Tessalônica (At 17.1-9). A sua permanência entre os tessalonicenses havia se tornado impossível, por causa da perseguição movida pelos judeus ciumentos que instigaram as autoridades locais contra o apóstolo. Por essa razão, lemos em Atos 17.10a que “ao anoitecer, os irmãos [de Tessalônica] enviaram Paulo e Silas a Bereia [também na província romana da Macedônia].”
NOTE QUE NADA É DITO SOBRE A PESSOA DE TIMÓTEO. É possível que ele não se encontrasse na casa de Jasom em Tessalônica na ocasião em que os irmãos de lá foram presos; também não estiva com Paulo e Silas quando eles se esconderam das autoridades tessalonicenses. É provável que, devido à sua participação mais discreta nas atividades evangelísticas do grupo missionário, Timóteo não tenha sido alvo direto de perseguição. Por essa razão, Paulo Anglada sugere que o filho na fé de Paulo pode ter permanecido mais alguns dias em Tessalônica, pastoreando a nova igreja e, somente um pouco depois, ter se unido a Paulo em Bereia, como se lê em Atos 17.13-14 que
13[…]quando os judeus de Tessalônica souberam que Paulo estava pregando a palavra de Deus em Bereia, foram até lá e criaram um alvoroço. 14Os irmãos agiram de imediato e enviaram Paulo para o litoral, enquanto Silas e Timóteo permaneceram na cidade [de Bereia].
É neste momento, conforme se vê em Atos 17.15, que “os que acompanharam Paulo o levaram até Atenas e, depois, voltaram a Bereia com instruções para Silas e Timóteo irem ao encontro dele o mais depressa possível.”
A CIDADE DE BEREIA ESTAVA LOCALIZADA a cerca de 80 km a sudoeste de Tessalônica, no terceiro distrito da Macedônia, fora da Via Egnatia, em uma via que se dirigia para a província romana da Acaia, ao sul. Embora não fosse uma cidade política ou economicamente importante, Bereia era bastante povoada, inclusive por cidadãos judeus.
A primeira informação que Lucas nos fornece sobre O MINISTÉRIO DE PAULO E SILAS EM BEREIA é de que – Atos 17.10b – “quando lá chegaram, foram à sinagoga judaica.” Não é possível dizer se eles se dirigiram imediatamente para a sinagoga ao chegarem à cidade. O relato de Lucas parece abreviado. Dependendo do dia da semana em que chegaram em Bereia, eles provavelmente encontraram primeiramente algum local para se hospedar, descansaram e, somente no sábado, foram à sinagoga. De qualquer modo, iniciar suas atividades evangelísticas entre os judeus e prosélitos reunidos para adorarem a Deus na sinagoga era parte da estratégia missionária do apóstolo. João Calvino, comentando esta passagem de Paulo em Bereia, enalteceu a firme determinação de Paulo para pregar o evangelho. Ouça:
A constância de Paulo é incrível, porque, tendo tido tal experiência [em Tessalônica], fruto da obstinação e malícia do seu povo, ele nunca cessou de tentar conseguir trazer algum deles a Cristo. Visto que ele sabia que era devedor tanto a judeus como a gentios, nenhuma injúria humana podia fazer com que ele desistisse da sua vocação.
O que chama a nossa atenção na ação missionária de Paulo em Bereia é que Lucas não diz nada sobre a pregação do apóstolo nessa cidade. Evidentemente, o registro de Lucas em Atos é seletivo, como já se poderia esperar. Todo historiador precisa fazer isso, se quiser fornecer aos seus leitores uma compreensão adequada dos acontecimentos, sem cansá-los com repetições desnecessárias.
Havendo, portanto, fornecido descrições pormenorizadas da base, do método, do conteúdo e do foco da pregação de Paulo em outras cidades (como já estudamos não ocasião em que o apóstolo esteve em Antioquia da Pisídia e Tessalônica, por exemplo), aqui Lucas se concentra na receptividade da mensagem. O seu objetivo é ressaltar a reação positiva dos judeus bereanos à pregação do evangelho, ao submeterem as declarações de Paulo ao escrutínio das Escrituras. Nas palavras de Lucas em Atos 17.11,
os judeus que moravam em Bereia tinham a mente mais aberta que os de Tessalônica e ouviram a mensagem de Paulo com grande interesse. Todos os dias, examinavam as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade.
Comentando esta passagem, Matthew Henry escreveu com perspicácia:
Os judeus se gloriavam por ser descendência de Abraão; eles consideravam-se de bom nascimento, e que não poderiam ser mais bem criados. [Aqui], porém, lhes é dito quem dentre eles eram os homens mais nobres e bem educados – aqueles que estavam dispostos a receber o evangelho [da cruz de Cristo]…
De fato, é nisto que está a nobreza: não em status de qualquer natureza, mas em se receber com fé o evangelho; é isto o que significa ter a mente aberta: receber com o coração o evangelho tal como o temos na palavra de Deus; e é deste modo que se deve ouvir a palavra de Deus: [1.] prová-la com gosto; [2.] pesquisá-la com garra; e [3.] praticá-la pela graça. Minha oração é que você seja assim: mente aberta, alma nobre, bom ouvinte da palavra de Deus.
Meu povo, o que temos no relato de Lucas é uma visão do que exatamente os cristãos bereanos fizeram quando entraram em contato como a palavra do evangelho anunciada por Paulo: eles quiseram confirmar se o que Paulo estava pregando era realmente a verdade bíblica. Este é o resumo de Lucas, mais uma vez, Atos 17.11: “[os bereanos] ouviram a mensagem de Paulo com grande interesse. Todos os dias, examinavam as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade.”
Essas palavras nos fornecem um paradigma de como a pregação da palavra de Deus deve ser ouvida – seja neste púlpito ou em qualquer lugar, a qualquer momento. De fato, essas palavras, conforme sugeriu Derek Thomas, fornecem uma resposta à pergunta: “Como devemos ouvir um sermão?” Numa época em que a expressão “pregar um sermão” significa descrever um desabafo ou uma tirada para se referir ao discurso tido como preconceituoso ou autoritário por parte de alguém, torna-se imperativo saber como ouvir um sermão. É o que ora buscaremos aprender: como devemos ouvir um sermão?
Thomas Cranmer (1489–1556), um dos principais líderes da reforma protestante na Inglaterra, em oração proposta para um domingo de advento, escreveu:
Bendito Senhor, que causou que toda a Sagrada Escritura fosse escrita para nosso aprendizado; conceda-nos que com sabedoria possamos ouvi-la, lê-la, marcá-la, aprendê-la e digeri-la interiormente; para que, pela paciência e consolação da tua santa palavra, possamos abraçar e manter sempre firme a bem-aventurada esperança da vida eterna, que nos deste em nosso salvador Jesus Cristo.
Ao “ouvir” a Escritura (lida e exposta/pregada), devemos “ler, marcar, aprender e digerir interiormente” o que se nos está sendo apresentando. Derek Thomas concluiu que Thomas Cranmer parece estar ecoando a descrição de Lucas à respeito de como os bereanos lidaram com a palavra de Deus pregada a eles por Paulo.
Lucas nos fornece três declarações que descrevem o envolvimento dos bereanos com a pregação que o apóstolo fez das Escrituras: os bereanos ouviram com grande interessa a mensagem (v. 11), examinaram as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade (v. 11) e creram no que ouviram (v. 12). Ouça:
Atos 17.11-12 11Os judeus que moravam em Bereia tinham a mente mais aberta que os de Tessalônica e ouviram a mensagem de Paulo com grande interesse. Todos os dias, examinavam as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade. 12Como resultado, muitos judeus creram, assim como vários gregos de alta posição, tanto homens como mulheres.
Valendo-nos da aliteração, podemos dizer que os bereanos [1.] provaram da palavra de Deus com gosto, [2.] pesquisaram na palavra de Deus com garra e [3.] praticaram a palavra de Deus pela graça. É isto o que fazem os ouvintes da palavra de Deus: eles [1.] provam com gosto da palavra, [2.] pesquisam com garra na palavra e [3.] praticam pela graça a palavra de Deus. Pois bem… Venha comigo… Observe e aprenda comigo como nós devemos agir como bons ouvintes da palavra (At 17.10-15) em face do ministério da palavra (At 17.1-9) — biblicamente falando, como reagem à palavra aqueles que são de alma nobre? como procedem em face da pregação da palavra aqueles que têm a mente aberta?
Esta é a primeira coisa: os ouvintes da palavra provam com gosto da palavra. Lucas informa (no versículo 11) que os bereanos (ARA) “receberam a palavra com toda avidez” ou (NVT) “ouviram a mensagem de Paulo com grande interesse”.
Eles estavam sedentos. Eles ouviram com expectativa. Eles provaram com gosto de tudo o que estava sendo pregado por Paulo. Eles estavam sendo sinceros e genuínos a respeito do que estavam prestes a ouvir; eles tomaram tudo aquilo como importante e necessário. Havia uma sentimento de expectativa sobre o que se estava ouvindo. Essa não era uma atitude meramente acadêmica, com a qual se engajar mantendo o distanciamento emocional. Tampouco os bereanos se envolveram na atividade de ouvir aquele sermão com familiaridade rotineira, sem entusiasmo, com um sentimento de obrigação e não de desejo, de sede e de grande interesse para a vida.
A atitude desse bereanos é a mesma daqueles que estão à caminho ou já chegaram ao estádio para assistir ao jogo de futebol; é como a daqueles que vão ou já chegaram à arena para o show da banda de rock ou da dupla sertaneja; é parecida com aquela de quem está indo ou já se assentou na poltrona do cinema, do teatro para o grande espetáculo; é idêntica à daqueles que estão se preparando para uma pescaria. Deixe-me ser honesto: entristece-me o quanto nós nos entusiasmados, interessamos, ficamos ávidos por essas coisas, mas nada sequer igual acontece quando o assunto é sermão, a pregação da palavra de Deus. Não é verdade?
Ouvir com avidez um sermão não é algo que vem a nós naturalmente; é algo que precisa de cultivo constante e cuidadoso. Permita-me propor o seguinte: seria um exercício interessante você se perguntar antes do sermão começar: o que exatamente eu espero que aconteça durante o tempo que o pastor estará pregando?
Sabe de uma coisa? — Em última análise, como a reforma protestante resgatou e os puritanos praticaram, a pregação da palavra de Deus é projetada para garantir que aqueles que ouvem o sermão sejam levados a um encontro pessoal com o próprio Deus. Afinal, o que é pregado é a palavra de Deus, a Bíblia, e o que emerge dela é a verdade de Deus. É pela palavra que o SENHOR aparece, manifesta-se ou se revela a nós (cf. 1Samuel 3.21, ARA). Nós pregadores podemos sim exigir e exortar como se, na linguagem de Paulo (em 2Coríntios 5.20), fossemos “embaixadores de Cristo; Deus faz seu apelo por nosso intermédio. Falamos em nome de Cristo quando dizemos: ‘Reconciliem-se com Deus!’.”
Os bereanos nos ensinam que os ouvintes da palavra devem provar com gosto da palavra quando a palavra é pregada com fidelidade bíblica e no poder do Espírito Santo. Para tanto, a gente – você! – precisa se preparar. EIS ALGUMAS DICAS: [1.] durma mais cedo no sábado à noite e descanse no domingo à tarde; [2.] ore e suplique ao Espírito de Deus que abra sua mente e seu coração para a palavra; [3.] leia com antecedência o texto bíblico que será pregado, medite nele, ore sobre esse texto, busque de antemão no texto o caminho que te leve a um encontro com Deus.
Além de se preparar para ouvir com avidez, além de estimular seu interesse para ouvir o sermão que será pregado, você, uma vez aqui, sentado, precisa saber como ouvir de modo a manter a concentração e o coração na exposição da palavra de Deus. EIS ALGUMAS DICAS: [1.] alguns se beneficiam tomando nota do sermão; [2.] coloque o celular no “modo avião” ou “não perturbe”; [3.] tenha o texto bíblico aberto diante de você, de preferencia de um modo que te permita tomar notas, marcar, anotar. E durante o tempo todo, mantenha-se em oração.
Os ouvintes da palavra provam com gosto da palavra de Deus.
Além de receber a palavra de Deus, além de provar com gosto da palavra de Deus, os bereanos examinavam a palavra, eles pesquisavam com com garra na palavra de Deus. Lucas nos diz que eles “todos os dias, examinavam as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade.” (At 17.11).
É difícil saber como os judeus de Bereia acessavam ou que tipo de acesso eles possuíam aos vários rolos do Antigo Testamento que se guardavam na sinagoga da cidade. Era improvável que eles possuíssem individualmente algum desse rolos (a aquisição era muito cara, envolvendo cópias meticulosas por parte de um escriba oficial). Portanto, fazia-se necessário que eles consultassem as cópias que eram mantidas na sinagoga. E foi assim que eles procederam. Todos os dias, subsequentes ao sermão de Paulo ou de Silas nos dias de sábado, esses judeus voltavam à sinagoga e examinavam os rolos bíblicos para verificar se as coisas que ouviram eram de fato verdadeiras. Algumas coisas emergem desse fato para nossa consideração.
O SACERDÓCIO DE TODOS OS CRENTES é a primeira observação importante a se fazer neste relato. Os bereanos pesquisavam as Escrituras por si mesmos. Eles não precisavam da intermediação de algum sacerdote ou quem quer que fosse para lhes ensinar o que precisavam saber sobre Deus e sua Palavra. É verdade que eles, sem dúvida, devem ter recorrido à ajuda do rabino local e daqueles que tinham certa maturidade no entendimento da Sagrada Escritura. Entretanto, a Bíblia estava ali aberta para todos quantos desejassem examinar. — No mínimo, portanto, deve servir de encorajamento para você trazer sua Bíblia com você para um culto de adoração e abri-la para acompanhar quando a palavra de Deus está sendo lida e pregada.
A CLAREZA DAS ESCRITURAS é a segunda observação necessária que emerge desta passagem bíblica. Os bereanos tomaram com garra as Escrituras em busca de verificação e compreensão da verdade. A Confissão de Fé Batista de Londres 1689 traz uma elucidação importante neste ponto (cap. 1, parágrafo 7):
Nem todas as coisas na Escritura são igualmente evidentes em si mesmas, tampouco igualmente claras para todos. Todavia, as coisas que têm de ser conhecidas, cridas e observadas para a salvação são tão claramente propostas e desveladas [postas à vista] em algum lugar ou outro da Escritura, que não somente os doutos, mas também os indoutos, com o devido uso dos meios ordinários, podem alcançar um entendimento suficiente delas.
ISTO É: não são todas as partes da Bíblia fáceis de compreender, mas o que tem de ser conhecido, crido e praticado para a salvação está sim muito claro no texto sagrado para que qualquer filho de Deus tenha acesso. Os reformadores chamavam isso de “perspicuidade” – a perspicuidade das Escrituras, a clareza das Escrituras.
Portanto, a Bíblia é sim clara e está aberta para o cristão comum nela pesquisar com garra a respeito do caminho da salvação, e assim crescer na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Foi isso que os bereanos buscaram fazer após cada sermão pregado por Paulo e Silas.
Seria interessante perguntar neste ponto o que exatamente os bereanos estavam pesquisando quando voltavam à sinagoga todos os dias para examinar os rolos do Antigo Testamento:
Você consegue imaginar a agitação desses irmãos fazendo perguntas ao texto sagrado? Eu consigo! Posso imaginar a efervescência por parte desses bereanos enquanto eles se questionavam e abriam os pergaminhos para ver se as coisas ditas por Paulo e Silas eram verdadeiras.
Isso tudo nos faz concluir ser importante resumir para nós mesmos uma forma de avaliar um bom sermão. Quais podem ser os princípios orientadores em nosso próprio caso, quando pregamos ou ouvimos um sermão? Derek Thomas fornece alguns critérios de avaliação para pregadores e para ouvintes:
Essa não é uma lista exaustiva, claro!, e cada geração terá que levantar seus próprios pontos de tensão e uma série de questões que devem ser engajadas para que se discirna a verdade bíblica. Essa lista, no entanto, nos fornece uma visão sobre os tipos de perguntas que devemos fazer ao ouvir um sermão. Ela destaca o quão engajada nossa mente e nosso coração devem estar ao ouvir um pregador expor a palavra de Deus.
Isso é algo que você faz regularmente? Qual é o seu parâmetro para ouvir uma pregação: a Bíblia ou suas necessidades sentidas? Você está sempre fazendo perguntas como essas ao ouvir seus pregadores?
CUIDADO! É importante acrescentarmos que avaliar sermões dessa maneira pode transformar alguns cristãos em meros críticos. Algumas pessoas acabam desenvolvendo um espírito crítico pelo qual não são mais capazes de apreciar os aspectos bons ou úteis de um sermão, e simplesmente se concentram no que é deficiente. Muito cuidado, pois trás desse tipo de “espírito bereano” pode estar camuflada uma forma de esnobismo e de arrogância espiritual.
Em todo caso, os ouvintes da palavra, assim como os bereanos, pesquisam com garra na palavra de Deus. Eles querem saber o que dizem as Escrituras a respeito de Cristo; eles querem ver e refletir a glória do Senhor, sendo transformados gradativamente à sua imagem gloriosa, tornando-se cada vez mais parecidos com Jesus (2Co 3.18).
Os bereanos não apenas provaram com gosto da palavra e pesquisaram com garra a palavra de Deus (v. 11); eles também, em terceiro lugar, responderam à palavra de Deus com fé, eles creram na palavra, praticaram pela graça a palavra de Deus.
Note como Lucas teve o cuidado de fazer a conexão entre a pesquisa que os bereanos fizeram e a resposta de fé que se seguiu: Atos 17.11-12
11Os judeus que moravam em Bereia tinham a mente mais aberta que os de Tessalônica e ouviram a mensagem de Paulo com grande interesse. Todos os dias, examinavam as Escrituras para ver se Paulo e Silas ensinavam a verdade. 12Como resultado, muitos judeus creram, assim como vários gregos de alta posição, tanto homens como mulheres.
A resposta dos bereanos foi proporcional e resultado de uma pesquisa cheia de garra na qual mente e coração estavam engajados com a palavra de Deus. Ouvir sermões deve resultar no desejo de colocar em prática o que se aprende. A boa pregação sempre aplica a Bíblia à vida diária. Bons sermões nos dizem a quais promessas devemos nos apegar em nossos problemas, quais pecados devemos evitar quando somos tentados, quais atributos de Deus devem suscitar louvor no coração, quais virtudes devemos cultivar, quais objetivos devemos perseguir, e em quais boas obras devemos nos envolver. Paulo teve o cuidado de dizer a Timóteo o seguinte:
2Timóteo 3.15-17 15Desde a infância lhe foram ensinadas as Sagradas Escrituras, que lhe deram sabedoria para receber a salvação que vem pela fé em Cristo Jesus. 16Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para nos ensinar o que é verdadeiro e para nos fazer perceber o que não está em ordem em nossa vida. Ela nos corrige quando erramos e nos ensina a fazer o que é certo. 17Deus a usa para preparar e capacitar seu povo para toda boa obra.
Paulo também escreveu em Romanos 10.17 (ARA) que “a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo.”
Tudo o que a Escritura ensina deve ser obedecido, praticado pela graça, por meio da fé. Essa foi a prática dos bereanos. Eles provaram com gosto da palavra de Deus, pesquisaram com garra na palavra de Deus e praticaram pela graça a palavra de Deus.
Atos 17.12 Como resultado, muitos judeus creram, assim como vários gregos de alta posição, tanto homens como mulheres.
A pregação fiel da palavra de Deus produz conversões genuínas, alcança e transforma pessoas que ninguém seria capaz de imaginar ser possível – ricos e pobres, homens e mulheres. Mas a pregação fiel da palavra de Deus não garante que não haverá perseguição, muito pelo contrário:
Atos 17.13-15 13Mas, quando os judeus de Tessalônica souberam que Paulo estava pregando a palavra de Deus em Bereia, foram até lá e criaram um alvoroço. 14Os irmãos agiram de imediato e enviaram Paulo para o litoral, enquanto Silas e Timóteo permaneceram na cidade. 15Os que acompanharam Paulo o levaram até Atenas e, depois, voltaram a Bereia com instruções para Silas e Timóteo irem ao encontro dele o mais depressa possível.
Paulo foi enviado para Atenas, mas Silas e Timóteo continuaram em Bereia, ensinando a palavra de Deus aos irmãos e fortalecendo aquela igreja.
Realmente, o mundo precisa de pessoas com mente aberta, aberta para a palavra de Deus – gente que prova com gosto da palavra de Deus, pesquisa com garra na palavra de Deus e pratica pela graça a palavra de Deus.
PARA VOCÊ, A PERGUNTA QUE CONTA É ESTA: como você ouve a palavra de Deus pregada? Você prova? Você pesquisa? Você pratica? Você se submete à verdade? — E como você vai saber se é verdadeiro? A resposta: voltando-se para a Bíblia e examinando-a. — Você não tem desculpa, meu amigo, minha amiga. Você tem uma cópia da Bíblia em suas próprias mãos, ou pelo menos uma em sua casa ou pode comprar alguma a preço bem acessível. E aí? Você será apenas um ouvinte? Ou você será tanto ouvinte quanto praticante da palavra? Esta é a única maneira honesta de ouvir um sermão!
S.D.G. L.B.Peixoto
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